domingo, 20 de fevereiro de 2011

A história do Recife no século XIX está marcada pela luta política. A Revolução de 1817, a Confederação do Equador, de 1824, a Revolução Praieira, de 1848. Criou-se um imaginário de lutas e de rebeldias. O Recife convivia com inquietações constantes, não se subordinava ao poder central, desafiava as ordens vindas do Rio de Janeiro. Não era mais uma vila, nem estava subordinado a Olinda. Tornou-se cidade em 1823 e capital de Pernambuco em 1827. O Recife conseguiu a autonomia pela qual tanto lutava.


Tudo isso produziu, também, suas mistificações, encobriu outros momentos e experiências, ficando a história reduzida à história política, a cidade formando uma identidade heróica que até hoje faz parte da sua memória. Mas um outro olhar sobre a cidade e sua história poderá nos revelar como seu espaço foi construído, como a sociedade foi tecendo o seu cotidiano. As rebeldias tinham, efetivamente, fortes relações com a modernidade, com se A época que se inaugurava exigia uma convivência, nem sempre equilibrada, entre o antigo e o moderno. A tradição era questionada, muitas vezes dissimulada. Existiam inúmeros contrapontos. O Brasil tinha feito sua independência política com clara influência das idéias liberais, mas não havia acabado com a escravidão. Era uma questão difícil de ser enfrentada, pois ameaçava as elites. Já vimos como os movimentos ditos liberais de 1817 e 1824 não foram muito explícitos com relação ao fim da escravidão ou mesmo à participação de negros na sua organização. A modernidade apresentava suas contradições, mais visíveis aqui, com a confusão entre liberais e conservadores nas suas práticas e escolhas políticas.


De qualquer maneira, tudo isso significava uma experiência histórica que se modelava nos chamados "estrangeirismos". Entre polêmicas, recusas, encantamentos, a modernização chegava ao Recife. Uma administração pública ficou marcada por investir na importação do moderno, a do presidente da província de Pernambuco, Francisco do Rego Barros (1837–1844), depois Conde da Boa Vista, um político ligado ao Partido Conservador. Eis aí um registro interessante: um conservador em busca de mudanças na sua urbe, ainda tão provinciana, se comparada às grandes capitais européias da época. O modelo era Paris, cidade emblemática do mundo ocidental, onde Rego Barros estudou. Ele não trouxe apenas as idéias, mas trabalhadores e técnicos franceses.

A paisagem mudava. Construíram-se estradas, a Ponte Pênsil de Caxangá, o Teatro de Santa Isabel. Fez-se uma reforma total na Repartição das Obras Públicas, além de um planejamento para o fornecimento de água potável ao Recife. Não havia no Recife, nem saneamento, nem água encanada, nem luz pública. O governo de Rego Barros não conseguiu concretizar todos os seus planos, mas efetivamente deu novos ares ao Recife, lembrou os tempos de Nassau. As ruas foram numeradas, seus nomes definidos, instalada luz pública a gás, padronização de prédios dentro dos princípios modernizadores europeus.

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